A MODERNIZAÇÃO
A partir do início da Era Meiji o governo japonês se esforçou na modernização da produção, tomando várias decisões: criação do Banco Nacional, ferrovia entre Tokyo e Yokohama, criação de uma indústria têxtil piloto na província de Gunma e o desenvolvimento agrícola com a criação do Ministério do Interior.
Empenhou-se sobremaneira no desenvolvimento industrial militar, utilizando-se de recursos provenientes da agricultura.
A primeira mecanização ocorreu por volta de 1890, primeiramente na indústria têxtil, estendendo-se depois para a fabricação de navios de guerra, canhões, armas, pólvora e uniformes militares, com a orientação de técnicos estrangeiros.
Desde o início desta industrialização, houve ligações estreitas entre o governo e os capitalistas privilegiados, impedindo que a modernização estivesse ao alcance de todos.
É, por exemplo, o caso do Grupo Mitsubishi.
Com a finalidade de empreender a expedição à Formosa em 1874, o governo adquiriu 13 navios a vapor para transporte militar e os entregou gratuitamente à empresa Mitsubishi da propriedade de Yataro Iwasaki, concedendo-lhe ainda recurso financeiro para tocar o empreendimento. Mesmo após a expedição a empresa continuou recebendo os mesmos benefícios, permitindo que ela monopolizasse todo o transporte marítimo japonês. Esse monopólio visava não o interesse do país, mas a manutenção do controle de transporte num eventual conflito militar.
Nessa mesma época foram construídas indústrias pilotos não militares e a exploração mineral foi colocada integralmente nas mãos do governo.
O proletariado do capitalismo militar veio principalmente dos pequenos agricultores e permaneceu em situação humilhante. Os casos mais extremos aconteciam nas minerações de carvão. A mina de carvão de San-Ike era estatal e a base da sua mão-de-obra era constituída de 2000 prisioneiros e 2000 agricultores que eram tratados da mesma maneira. Numa das minas houve em 1883, incêndio de grandes proporções. A empresa, ciente da existência de 24 prisioneiros e 22 trabalhadores no seu interior, mandou selar a entrada para extinguir o fogo. Logicamente, ninguém sobreviveu...
Dois anos após o incidente a mina seria vendida quase de graça ao Grupo Mitsui que continuou a explorá-la da maneira semelhante, obtendo a partir daí, grande impulso para se estabelecer na mineração e na indústria, tornando-se uma grande potência econômica.
O Grupo Mitsubishi não possui uma história muito diferente: Adquirindo de Zojiro Goto a mina de carvão Takashima, que, por sua vez a comprou do governo por um preço irrisório em 1881, deu o seu primeiro passo em direção à mineração e à indústria. Esta aquisição, porém, se tornaria uma das páginas mais negras e tristes de toda a história do capitalismo japonês. Em 1884, quando houve uma epidemia de cólera no local, a empresa eliminou literalmente todos os doentes (1500 pessoas) que manifestaram o sintoma, um dia após o seu aparecimento, queimando-os sobre chapas em brasa sem ao menos se certificar se estavam vivos ou mortos!
Na área da manufatura, a situação dos operários não era muito melhor. Trabalhavam diariamente de 12 a 16 horas, recebendo um salário irrisório, para não dizer desumano. O governo, conhecedor dos movimentos trabalhistas do exterior, utilizava todos os recursos para evitar os focos de revolta. Além do mais, fazia valer ao máximo o poder ilimitado do Imperador, criando uma verdadeira religião em torno da sua figura.
O povo pouco conhecia da função política do Imperador, mas tinha-no como uma divindade para a adoração...
O absolutismo imperial, entretanto, não poderia subsistir a tantas contradições presentes na vida japonesa. Em primeiro lugar, ele era baseado num fato distante de uma realidade palpável, e, portanto, longe do pragmatismo do desenvolvimento moderno. Em segundo lugar, o desenvolvimento do capitalismo pôs em cheque a estrutura imperial de uma sociedade classista e patriarcal culminando com o enfrentamento entre os grandes latifundiários e capitalistas de um lado e os agricultores e o proletariado do outro.
O IMPERIALISMO JAPONÊS (1905~1945)
Vencendo a Rússia, o Japão obteve imensas colônias e sub-colônias, tornando-se a maior potência do extremo oriente. Isso representava também o confronto com as outras potências imperialistas. A Rússia se concentrou na disputa do Oriente Médio com a Alemanha atenuando o atrito com o Japão. Em julho de 1907 o Japão assinou um acordo secreto com a Rússia, a Manchúria e a Mongólia, determinando a área de influência, assim como outros dois acordos em 1910 e em 1912 nos quais a Rússia reconhecia o poder do império japonês.
Havia, concomitantemente, um confronto com a Inglaterra e, principalmente com os EUA. Os três acordos com a Rússia significavam um desafio contra estes dois países que apoiaram o Japão financeiramente (quase 50% dos gastos) na guerra contra a própria Rússia, pois tinham também interesses naquela área e tencionavam evitar o avanço russo à Manchúria. Porém, o próprio Japão agora tentava tomar posse do território da Manchúria. Pressionado pelo exército, que a esta altura agia independentemente do governo, o Japão quebrou o contrato de cooperação com os EUA na construção da ferrovia naquela região. Já em dezembro de 1905 o Japão havia estabelecido um plano secreto de domínio da região e esta pretensão irritou sobremaneira a aliança Inglaterra-EUA.
Como retaliação, o governo americano proibiu, em fevereiro de 1907, a imigração dos japoneses de Havaí, Canadá e México aos EUA, proibição esta que foi revogada com a reaproximação japonesa.
Mas, com o decorrer do tempo, os atritos e provocações mútuas aumentaram.
No Japão a militarização estava em pleno avanço e o exército adquiria mais e mais poder. O avanço e a conquista da China se tornou o objetivo e prioridade do império e, portanto, preponderante para as forças armadas. E esta pretensão estava diretamente ligada com a colisão com as forças ocidentais. Tomando como as bases do seu avanço a colônia coreana e o sul da Manchúria, o exército japonês iniciou o avanço rumo à conquista da China que só se interrompeu com a derrota na Segunda Guerra Mundial, em 1945.
Este poder militar tinha como apoio os capitalistas emergentes com privilégios decorrentes de grandes interesses militares (Ex.: Mitsubishi), os grandes capitalistas tradicionais privilegiados (Ex.: Mitsui), e os grandes latifundiários.
Surgiram, simultaneamente, movimentos contra a militarização, de um lado os operários e lavradores, defensores do socialismo e, de outro, os capitalistas menos privilegiados, defensores da democracia, enfim, a classe média nascente. As greves se sucederam logo após a guerra contra a Rússia. Estes movimentos foram sistematicamente reprimidos e o socialismo permaneceu sob a mira dos poderosos. À medida que aumentava a repressão, aumentava também a reação dos revoltosos a ponto de em 1909 os anarquistas Suga Kanno e Takichi Miyashita tramarem o assassinato do imperador. Eles, porém, foram descobertos logo no início do complô. O governo se aproveitou da situação para condenar os líderes políticos que lhe eram incômodos para prender como cúmplices. Assim entre maio e junho de1910, 24 pessoas foram condenadas à morte, dentre as quais 12 executadas e as restantes comutadas para a pena de prisão perpétua.
O governo, utilizando-se dos meios de comunicação, reprimiu de tal modo o termo socialismo, ou a própria palavra “sociedade”, que ele foi censurado mesmo nos livros didáticos (p. ex.: a sociedade dos insetos). Porém, nem assim foi capaz de evitar movimentos esporádicos de greve e manifestações contra a elevação dos preços e outras arbitrariedades, e, em agosto de 1912, Fumiharu Suzuki, conhecedor da Doutrina Social Cristã e dos problemas trabalhistas, fundou uma associação denominada Yuuaikai, isto é, Associação do Amor Fraterno e serviu de ponte entre os interesses trabalhistas e os capitalistas na luta pela melhoria da qualidade da vida e da formação dos trabalhadores. Esta associação que se iniciou com apenas 15 pessoas logo se tornou um movimento nacional com mais de 20 mil associados. Num país em que era proibido o movimento sindical, Yuuaikai exerceu funções atinentes a este.
O capitalismo estimulou também o desejo de maior democracia representada pela classe média emergente que defendia maior igualdade, pondo em cheque a estrutura ainda bastante classista e fechada. Era o reflexo do desenvolvimento social: o número das empresas que em 1897 era de 6000, passou para 10000 em 1907 e 13000 em 1910, e o capital triplicou nesse período. Uma nova camada de população com instrução acima do nível secundário começou a crescer, composta por assalariados, professores, médicos, técnicos, jornalistas, artistas, advogados, etc. Esta camada não era composta somente de pequena e média classe burguesa, mas também pela classe latifundiária e pelos agricultores em melhores condições. Em 1897 os formandos de níveis intermediários eram apenas 2500; em 1907 passaram para 14000 e em 1912 para 18000. Estes formavam, cada qual, a liderança da sua região. O ensino básico também foi aperfeiçoado e a freqüência às escolas primárias que em 1874, dois anos após a sua implantação, era de 32%, passou para 70% em 1900 e 98% já em 1910. O ensino obrigatório que era de 4 anos, passou para 6 anos em 1906.
De 1909 a 1911 debateram-se o direito de voto de todo o cidadão, independente da posse, e criticavam-se a militarização, a estrutura patriarcal, o regime opressor e a própria autoridade imperial. Houve, além disso, tentativas de se descobrir as corrupções envolvendo as compras militares que culminaria com o “Escândalo Siemens”, cinco anos mais tarde.
Entretanto, o governo ao invés de suspender o imposto extraordinário devido à guerra com a Rússia, tornou-o mais pesado para sustentar e reforçar a militarização, colocando em dificuldades as pequenas e médias empresas, enquanto os grandes capitalistas obtinham lucros astronômicos. Os desmandos do exército cresceram a tal ponto que em 1912, influíram diretamente na demissão do Premiê.
Em julho de 1913 morreu o Imperador Meiji e se iniciou a Era Taisho. O novo Imperador, muito jovem e sem apoio de políticos experientes, foi instrumento de manobra do exército que logo obteve os principais postos governamentais, tendo Katsura como Primeiro Ministro, apoiado financeiramente pelo Grupo Mitsubishi. Ocorreu então o atrito com a Marinha, que provocou uma onda de manifestações populares em Tokyo e se espalhou a seguir para Osaka, Kyoto, Kobe e Hiroshima, provocando a queda de todo o ministério. Os historiadores comentam que se o movimento popular continuasse, ele poderia ter causado o colapso da militarização do país... Os próprios opositores do governo, entretanto, temendo uma guerra civil, debelaram o movimento.
Subiu ao governo então Gonbee Yamamoto da Marinha que retomou o reforço militar. Aconteceu, então o “Escândalo Siemens”: o recebimento de propinas pelos principais elementos da Marinha das empresas Siemens da Alemanha, Vickers da Inglaterra e Mitsui do Japão durante vários anos no favorecimento na construção da frota japonesa, acabando por resultar na queda de todo o ministério Yamamoto. Houve, na oportunidade, manifestação popular diante do Congresso, reprimida por 4000 policiais.
Com o sucessivo atrito entre o Exército e a Marinha, e posterior escândalo, não havia mais opção para o novo Parlamento. Foi escolhido, então, Shigenobu Okuma, já experiente no cargo, como Primeiro Ministro. Quatro meses após a sua nomeação eclodiu a Primeira Guerra Mundial (4 de agosto de 1914) e os dirigentes do país viram no acontecimento a oportunidade de levar adiante o plano de domínio chinês e a obtenção de uma posição de destaque no cenário mundial.
Os governantes da época difundiam à população a idéia de que o país alcançara o patamar do primeiro mundo ao derrotar uma das grandes potências da época, a Rússia, obtendo em conseqüência colônias 8 vezes maiores que o seu próprio território e a sub-colônia (sul da Manchúria) do tamanho do seu território. Fora do eixo ocidental era o único país que possuía educação de grau médio e superior na língua vernácula e exército e marinha dos mais respeitados do mundo.
Porém, esta falsa aparência já era desmascarada em 1909 pelo maior escritor moderno japonês Soseki Natsume: ele comparava o Japão ao sapo imitando um touro...